24 jun 2013

Meditação - Natividade de São João Batista

Rev. Ariel Montero
Isaías 40, 1-11
Salmo 85
Atos 13, 14b-26
Salmo 85, 11 - Benn (1905-1989)
Lucas 1,  57-80

Introdução
            Hoje estamos celebrando, liturgicamente, a natividade de São João Batista. Na tradição cristã, a memória litúrgica do nascimento é reservado a pouquíssimas ocasiões: Jesus Cristo, Maria, João Batista. Por este fato, merece nossa atenção esta celebração. São João Batista é importante em nossa fé, pois, foi o escolhido como o Precursor, aquele que viria a preparar o caminho para o esperado Messias, Jesus Cristo, nosso Senhor.  A vinda de João Batista foi profetizada pelo profeta Isaías.
Uma voz clama no deserto preparem o caminho para o Senhor; façam no deserto um caminho reto para o nosso Deus (Is. 40, 3).
     Que João Batista, voz que clamou e anunciou a necessidade de mudança no seu tempo e no seu contexto, ilumine nosso hoje.

Ver nossa realidade
Qual é nosso contexto atual? O que estamos vivenciando como sociedade precisa ser refletido a partir da Palavra de Deus, e particularmente, a partir da figura emblemática do Precursor.
Obviamente que as diversas manifestações ou protestos públicos que atingem nossas cidades, e de alguma maneira, a todos nós, devem ser confrontados com da Palavra de Deus. Nenhum de nós pode se sentir alheio às diversas expressões coletivas que tem tomado conta das ruas nas principais capitais do país.
Nesta realidade tem luzes e sombras. Tem sinais do Reino e sinais do anti-reino. Cabe a nós cristãos aprofundarmos o discernimento. Portanto, qual são os sinais do Reino e do anti-reino neste contexto? Naturalmente, estas considerações são deste uma perspectiva parcial e particular.
Qual é o grande sinal do reino que está manifestando-se? A meu entender: o desejo de justiça e a indignação frente a corrupção. Não é por 20 centavos! Este desejo, legítimo, tem se tornado visível de diversas maneiras, cores e expressões. Porém, também temos que nos perguntar pelos sinais do anti-reino que emergem: a violência de um grupo minoritário infiltrado nas manifestações de rua, a manipulação possível dos poderosos de sempre e a auto-designação como porta-vozes de um movimento sem bandeiras por outros.

Julgar a luz da Palavra de Deus
Dos múltiplos e diversos aspectos que a Palavra de Deus hoje nos trás, quero destacar três citações que podem nos ajudar no discernimento:
ü  Isaías 40, 1-2: “Consolem, consolem o meu povo. Falem carinhosamente aos moradores de Jerusalém, e digam-lhes que já terminou a sua escravidão...”.
ü  Salmo 85, 10-11: “A misericórdia e a verdade encontraram-se, a justiça e a paz se beijaram. A verdade brotará da terra; e lá dos céus olhará a justiça”.
ü  Lucas 1, 78-79: “Pois o nosso Deus é misericordioso e bondoso. Ele fará brilhar sobre nós a sua luz e do céu iluminará todos os que vivem na escuridão da sombra da morte, para guiar os nossos passos no caminho da paz”.

A primeira destas três citações, Isaías, inaugura a segunda parte do Livro do profeta, o chamado Livro da consolação. Terminado o tempo de escravidão do povo de Israel, este se prepara para um novo Êxodo sob a guia de Deus. Estas palavras do profeta evocam em mim uma releitura a partir de nossa situação atual.
Como sociedade, vivemos num momento de “despertar” e “gritar” sentimentos presentes mas não manifestos explicitamente. Um sentimento coletivo de que a democracia é responsabilidade de todos nós.
Se este sentimento amadurecer, e devemos trabalhar para que isto aconteça, a participação na construção cidadã deverá ter novo vigor. Refiro-me à participação coletiva e constante no desenvolvimento da uma sociedade realmente igualitária e equitativa na sua distribuição de renda. A real participação cidadã não deve ser restrita a uma noite na rua, deve se expressar no momento do voto e nos diversos momentos que a vida política reclame nossa participação.
A segunda citação, do salmo 85, 10-11, nós trás uma palavra iluminadora. Schokel, um dos mais destacados biblistas resume estes versículos: «Como personagens que escoltam a glória divina são convidados, desde pontos diversos, à misericórdia, verdade, paz, justiça. Verdade e justiça enlaçam céu e terra em perfeita harmonia». Síntese absolutamente singular e apresentada neste salmo e particularmente nestes versos. Na particular conjuntura que vivemos não podemos perder, desde uma leitura de fé da realidade, a sintonia e o encontro que deve acontecer entre a misericórdia, verdade, paz e justiça. Considero ser os quatro elementos fundamentais para nosso discernimento pessoal e comunitário neste momento.
As manifestações, ou minha manifestação, estão baseadas e tem como fundamento a construção e vivência da misericórdia, da verdade, da paz e da justiça? No encontro delas construímos cidadania, onde mesmo questionando o poder público somos responsáveis pelo seu destino e êxito. Como cristãos, o exemplo de São João Batista nos inspira; no deserto clamava para que todos endireitassem seus caminhos, devemos clamar, lutar por justiça social, para assim podermos trabalhar em prol do Reino de Deus.
Finalmente, a citação do Cântico de Zacarias, também conhecido como Benedictus, anúncio esperançado da missão do Precursor, João Batista. Anúncio que trilha e guia nossos passos pelo caminho da paz. Paz ativa que constrói cidadania em lugar de destruí-la.

Elementos para nosso atuar
O principal elemento que esta Palavra de Deus nos deixa hoje, a meu ver, é a da necessidade do discernimento. Somos responsáveis pelo destino de nossa sociedade, de nossas cidades, de nosso país. Perante as diversas e variadas vozes que surgem, a Palavra de Deus nos convocará ao discernimento, a sabermos ver, mesmo que de forma tênue, os sinais das trevas e os sinais da luz do horizonte que nos convoca para fazermos oração e realidade as palavras do salmista: A misericórdia e a verdade encontraram-se, a justiça e a paz se beijaram. A verdade brotará da terra; e lá dos céus olhará a justiça!

Conclusão

Que no momento de partilharmos a Eucaristia, sacramento fonte de nossa fé, sintamos fortemente este compromisso e façamos verdade, na nossa cotidianidade, a vivência de nossa opção pelo Reino de Deus e pelo Deus do Reino!